Carta para o “bom velhinho”.
“ Todo o universo tem em ti um pronto socorro nas aflições, um encorajamento nas tristezas, uma consolação nas calamidades, um defensor nas tentações, um remédio salutaríssimo nas enfermidades.” São Niicolau
A-B-C-D-G… “(Não, não, tá errado!)” O condenado apaga a letra “G”.
A-B-C-D-E “(agora sim!)”, F-G-H-I…
“Tic, Tic, Tic” (uma chave bate na grade).
-Sr. ex-presidente?
- …
- Sr. ex-presidente? (aumenta o tom da voz)
- Oi, diga companheiro, meu advogado veio falar comigo?
- Não, senhor.
- O que é isto na tua mão; uma carta?
- É para o Senhor, veio do seu Partido. O guarda entrega-lhe a carta. Ele abre; começa à leitura.
(“Sr. Presidente, primeiramente #ELENAO)
- O que é esse desenho, que parece com o jogo da velha? Pergunta o condenado.
- Deixe-me ver senhor… Ah, sim! isso se chama Hashtag!
-O que?…
- Não é nada demais senhor, pode continuar sua leitura, aliás, vim aqui somente para entregar a carta e desejar-lhe feliz Natal!
O condenado arregala os olhos e suplica para que o guarda fique! “(#elefica)”
- Por favor companheiro, fique comigo, preciso da sua ajuda ( sussurra o presidiário).
-…
-Você sabe, somente aqui estou conseguindo me dedicar à leitura; não tive tempo para o estudo, mas graças a Deus hoje estou aqu…, quero dizer… veja como são as coisas, Os mistérios de Deus não é mesmo? “Deus escreve certo por veredas tortas!” — rêrêrêrê. A palavra “veredas” o condenado aprendeu com a capa de um livro que “espera ler”.
- Por quê o Senhor deseja minha presença?
- Ah, sim! Porque tenho dificuldade na leitura. Não sei se você percebeu (sussurrando) mas quando estou para depor costumo não ler os papéis que me entregam, papéis estes, “Que dizem ser ‘uma prova!’”; imediatamente entrego para o meu “branquinho fofo!”.
- “Branquinho fofo?”
- É como a “mulher” do meu advogado chama ele — rêrêrêrê — !
-…
-Voltando ao que ia dizendo, preciso da sua ajuda pra lê esse “trêm” aqui (aponta para a carta)!
- Ok.
-Aê, companheiro!
- …
“ 23 de Novembro de 2018. Excelentíssimo Sr. …
-S,R e ponto??
-Deixe-me ver. Esta sigla “SR.” é uma abreviação para “Senhor”.
- Entendi. Vou continuar!
“23 de novembro de 2018.
Excelentíssimo Sr. “(Senhor)” Presidente, primeiramente #ELENAO #SOMOSARESISTENCIA.
Depois da visita que nosso camarada espanhol fez ao Sr. “(Senhor)” na prisão, e da coletiva de imprensa que organizamos, para ali, em alto e bom som os golpistas, fascistas e conservadores ouvissem a voz de nossos apoiadores. (obs: Estamos tentando entrar em contato com o Papa!).
Sabemos que o Sr. está IN-JUS-TA-MEN-TE…
- Isso, leia devagar…
“INJUSTAMENTE aprisionado, e o Povo também sabe, assim como Pedro e João estavam…”
-Quem é Pedro e João? São Socialistas?
- Eles estão se referindo aos apóstolos de Jesus Cristo senhor ex-presidente.
- Gostei disso, gosto dessa carga religiosa!
-Continue a ler sr. ex-presidente.
-Vamos lá!
“Onde o Sr. está INJUSTAMENTE aprisionado, assim como Pedro e João “(Os apóstolos de Cristo)” estavam. Um Homem com uma índole impecável e santa não merece passar por isso. A sua imagem é a imagem do Partido. Louvado seja o sr. excelentíssimo!”
-?Hum!? Isso realmente está escrito na carta sr. ex-presidente?
- Sim, é o que está escrito, veja…
-É, está correto mesmo, continue.
“A sua imagem é a imagem do Partido. Louvado seja o sr. excelentíssimo! Caminharemos em procissão e marcha para que a sua liberdade seja assim feito! Depois da coletiva que nosso companheiro Castelhano fez, ele nos deu uma ideia que achamos, por assim dizer, genial! Resolvemos colocar o nome do senhor para o Nobel da Paz!”
-Companheiro? Não entendi muito bem não, eles querem colocar o meu nome para o “Nobel da Paz”?
- Sim, senhor. È o que parece.
- …,mas estou preso! (!?)
O rádio do guarda interrompe a conversa e anuncia:
-É o advogado do presidente. Ele quer vê-lo!
- Pode mandar entrar! Responde o guarda.
-Sr. ex-presidente, o seu advogado veio lhe visitar.
-Ô, maravilha! Vou aproveitar e pedir pra ele corrigir minhas lições de caligrafia!
O advogado entra na cela do criminoso e logo fala dos processos, “Sr. Presidente precisamos falar do apartamento da sua Filha!”.
O guarda se despede. A cela é trancada. O guarda diz:
- Boa sorte no “Nobel da Paz!” sr. ex — presidente. Feliz Natal!
Ninguém responde.
*
Às Horas passam.
“A conversa do advogado com o ex-presidente foi longa”, é o que fofocaram os policiais.
-Em resumo, esse foi o papo que eles tiveram. disse um dos guardas no meio da fofoca: O ex — presidente tomou duas garrafas d’água de 500ml e suava como um porco!
“Paramos um andar do nosso prédio só para trabalhar em seus processos!”, reclama o advogado ao ex-presidente, “… e segundo a sua contabilidade, você não está muito bem financeiramente…”, continuava o advogado, “…este mês, olhe quem pagou pra gente, foi o X!”.
“Com minha contabilidade, quem toma conta sou Eu, caralho! Agora, some daqui!”, responde o ex-presidente, “…resolva essa merda!”.
“ Esses são os novos processos que o senhor terá de responder, leia — os…”, e com essa frase o advogado termina a discussão. “…” o ex-presidente nada responde, pega os papéis, passa os olhos no processo e joga-os em cima do seu caderninho de caligrafia.
O mês de Dezembro não perdoava ninguém com o seu estridente calor — característica desse país tropical -, dilacerando o ar e o corpo de quem caminhava pelas ruas. No chão da cela, dardos que vinha da sombra das folhas secas duma árvore na rua fazia o presidente olhar fixamente. Ele se Levanta. Olhando pela grade, vê a bandeira do Brasil ondulando.
“(Parece até um país de sucesso!)” diz em pensamento o ex-presidente. “(Parece que há vento somente naquela bandeira!…)” continua refletindo…
Não conseguiu mostrar sua lição de caligrafia, que, praticado há quatro meses contou 15 páginas concluído: talvez demore um pouco essa correção (pensou o ex-presidente ). Ainda olhando pela grade, suando como um porco, presumiu que fosse, talvez, meia-noite. “(A grande noite de Natal!)”, ouviu essa exclamação de alguém da família. Resolveu então escrever uma carta de “Natal” para o bom velhinho “(quem, sabe!…)”, mas a primeira pergunta que alguém que queira escrever uma carta para o Papai Noel precisa fazer, deve ser esta: Você foi um bom menino (a)?
O presidente ficou exatamente 3 horas sem escrever uma palavra no papel — talvez caiba algum limite para a mentira, ou é a dificuldade de escrever mesmo -, não sei. Olhou outra vez fixamente para aquele dardo que vinha da sombra das folhas secas duma árvore na rua. Ficou pensando.
Passam-se às horas…
Começou os fogos de artifício. É Natal! Os flashes de luz acendem e apagam na cela do presidente, que um dia foi para alguns, um santo, e para outros “Es Sanctus”.
Risos, festejos e confraternização, é o que se ouvia na “ala” dos policiais e do povo do lado de fora do presídio. Dentro da Prisão ouve-se o eco dos rojões e o barulho d’uma das cela se abrindo. È a cela 314. Um homem sai dela e é transferido para a cela 320, os policiais trancafiam alí os dois homens. 314 subornou o guarda para que mais uma vez ele e seu amante (o 320) pudessem ficar juntos, nem sempre o 314 aderiu à essa moral homo sexual, ele ama sua mulher e seus filhos, mas “a ocasião fez-se o ladrão” como diz aí alguns “filósofos”. Os dois detentos se beijam, apertam-se e tiram suas roupas, o barulho dos rojões misturam-se com os gemidos que ecoa no presídio. Alguns guardas assistem ao filme com 4 dimensões. Na cela do nosso ex-presidente um lema toma conta de sua mente: a Cruz ou a Espada? “Será que a cana é doce?”. Já em outras celas eles preferiram aderir, por enquanto, à Cruz, e aderir à Cruz, significa silêncio, e silêncio significa ouvir; ouvir os gemidos agonizantes dos amantes!
Feliz Natal!